terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Ser ou não ser?

Wagner Moura aceita o desafio de ser o principal personagem de Shakespeare

Depois de viver o conflituoso capitão Nascimento, no filme ‘Tropa de Elite’, Wagner Moura encarna o clássico dilema de ‘Hamlet’. Além de atuar, Moura é produtor e co-autor da tradução do espetáculo, em cartaz no teatro Faap.

Como agiria o truculento capitão do BOPE diante das agruras – e que não são poucas – vividas pelo príncipe da Dinamarca? Como se já não bastasse perder o sono com visões do pai, um defunto que pede por vingança, o príncipe ainda tem de aceitar o casamento de sua mãe com o tio trapaceiro e encarar a morte da amada. Para quem acha que o capitão tentaria encontrar um substituto, acertou. Alguém à sua altura? Errado. À altura de Wagner Moura. Para o diretor do espetáculo, Aderbal Freire-Filho, responsável pela escolha de Moura para substituir outros tantos Hamlets (competentes), o ator possui emoção e inteligência, dois elementos importantes para se encenar um personagem tão complexo como o herói shakespeariano.

Não ser
Com atores que se dividem entre atuar e filmar suas performances em cima de um palco sem castelos, a montagem de Aderbal e Moura não é o que o público está acostumado a ver. O texto, traduzido do original, abandonou os traços de séculos atrás para dar voz ao coloquialismo. Esse contemporâneo Hamlet de fala, também usa jeans e tênis. Já as dúvidas vividas pelo mocinho, são as mesmas.


Moura e Amarante, autor da trilha para o espetáculo

quinta-feira, 29 de maio de 2008

É de chorar (Parte 1)

... A última vez? A última vez... (pigarro) eu já era adulto? Não... Sim, sim, a última vez que eu chorei eu já era adulto. É verdade. Aliás, chorei por ter de me tornar um. Pois é (pigarro), o grande cisco da responsabilidade de ser pai me pegou de jeito pelo travesseiro, fazendo com que eu reproduzisse a mesma choradeira de quando vi a Cuca, pessoalmente. Meus pais riam e diziam: “Num ‘chola’, você não é mocinho? É só a Cuca, filho, a Cuca...” E eu: “Por acaso, essa aí não é aquela da musiquinha... aquela que irá me pegar caso eu não caia no sono, e depressa?” Eu teria soltado esta aos sádicos que já se diziam meus pais, mas falar é complicado quando lhe enfiam uma chupeta na boca.

No entanto, a diferença de (tosse)... a diferença de eu ver, sei lá... um réptil, que anda, fala e usa batom, ou de saber que minha namorada – hoje, esposa – carrega não uma, mas duas herdeiras de um papai que vivia de bicos, está na causa. Se nos dois episódios o tal pranto foi resultado do impedimento de voltar pra barriga da minha mãe, em outras circunstâncias das mais variadas, que vão desde o São Paulo campeão a funerais de avó e tios, não teve choro, no máximo vela. Não consegui deixar rolar uma única gota de lágrima.

(Pausa para água) Momentos após o nascimento das minhas filhas, na sala de espera da maternidade, alguns familiares ostentavam cada um o seu par de olhinhos úmidos ao passo que me parabenizavam. Não peço para que acredite, mas essas gratificações não passavam de um disfarce para a inconveniente pergunta que viria a seguir: “E aí, chorou?” Pensei ligeiramente em mentir, mas me lembrei de que mentira tem perna curta para pais que são filmados na sala de parto. Um mês depois, assistia ao filme do nascimento e aproveitava para tentar encontrar ali alguma passagem em que eu demonstrasse, pelo menos, alguma intenção de pôr pra fora toda a emoção sentida naquele dia. E encontrei. Orgulhoso, exibi o tal choro oculto a uma tia da minha esposa: “Tá vendo aí, ó? Nessa hora, eu tava chorando... por den-tro.” E: “Ah, mas assim não tem graça”, sentenciou a titia.

É (tosse), não chorar pode causar exclusão social. Sim... eu sei que se parece mais com um daqueles avisos pra fumantes, mas a advertência tem fundamento. (Pausa para água) Depois de semanas tentando me enturmar no novo colégio, enfim, uma das panelas resolvia falar sobre cinema. “Perfeito!” Era só eu fazer com que rissem, lembrando-os de filmes de chorar de rir, e, então, eu ganharia passe livre. É, ficaria à vontade, sabe... para lançar na rodinha qualquer tipo de bobagem, qualquer uma... Menos a de atestar minha insensibilidade, confessando a um monte de menininhas que eu não chorei em O Rei Leão. Mulheres! Tenho uma tia que chorou em Jamaica abaixo de zero.

Já a morte do piloto (e chorão) Ayrton Senna teve sua atenção dividida. Aquele primeiro de maio também me marcou com outra grande surpresa. (Tosse) Sim... já vai entender. Naquela noite, eu assistia com meus pais a uma dessas reportagens especiais de final de domingo, meladas de depoimentos saudosos, imagens em slow motion e trilhas melancólicas de fazer até “chefe de família” apelar para o lencinho. A fim de compartilhar um “humor negro” que me ocorreu, inclinei-me para eles. E foi então que vi algo ainda mais surpreendente do que uma batida na curva Tamburello, a trezentos quilômetros por hora: o meu pai com os olhos vermelhos. O mesmo que me... me reprimiu, de certa forma... por abrir a boca para a Cuca... estava choramingando... de cueca... no sofá. Minha mãe, embora estivesse de pijama, escancarava ainda mais a sua intimidade, chegando até a soluçar... E quanto a mim? (Pausa) Tarde demais. Tarde demais. Ironicamente, já estava arraigado em mim os “bons modos” de que mocinhos não choram.

Mas (tosse), felizmente, alguns anos depois, minha grande chance de provar que eu também tinha um coração chegaria pelas mãos de minha prima e seu noivo. O par trazia um convite para que minha esposa e eu fôssemos seus padrinhos de casamento. Finalmente, o meu choro tinha dia, hora e local. E se o fato de minha prima me escolher para ser seu padrinho, entre tantos outros primos, já rendesse àquele momento algumas lágrimas extras, imagine só ser escolhido também pelo noivo? Como por quê? Isso não só dobravam as expectativas em cima do presente, mas na quantidade de lágrimas com a qual eu teria de arcar.

Desafio aceito. Resolvi, então, investir na (minha) grande noite: fui às compras. Comprei sapato, terno, gravata e até uma camisa lilás, chegando a pensar que o tom faria de mim um homem mais sensível. Olhava-me pelo espelho do provador e já podia imaginar os comentários que cairiam sobre mim: “Menina, olha que chorão mais charmoso! (...) Ô, homem sensível! (...) Aquele ali, o da esquerda, menina... Ele, sim, gosta dos noivos, de verdade! (...)” Por outro lado... (tosse) eu pensava... (pausa para água) no constrangimento (tosse)... eu pensava no constrangimento pelo qual eu passaria caso destoasse do grupo de padrinhos, não manifestando os meus sentimentos. Gafe bem pior do que subir no altar de terno cáqui em meio a senhores de preto. Para padrinhos, chorar em casamento é regra de etiqueta!

Já nos bastidores da cerimônia, minutos antes de nossa entrada, surgiam as apostas em cima dos que primeiro entregariam os pontos lá em cima, no altar. Os padrinhos menos experientes, eles respiravam fundo enquanto aprendiam com os mais entendidos a estocarem o bolso do paletó com guardanapos para estancar a emoção e conservar os rímeis de seus pares. Eu, em compensação, não impediria que o alívio rolasse até dar gosto à boca... exibiria, com orgulho, minha façanha para o registro das câmeras, bem na hora dos cumprimentos. (Pausa para água)

Bem... com noivo e padrinhos a postos e, consequentemente, a poucos minutos dos cumprimentos, as cornetas já podiam entornar a tão esperada marcha. Mas a noiva preferiu explorar ainda mais o clima de “suspense”, e ser anunciada por Also Spracht Zarathustra – o belo poema sinfônico de Strauss que, para minha infelicidade, faz parte da trilha do filme 2001: uma odisséia no espaço. Algumas tias, primas e amigas da noiva já começavam a se borrar, e eu só conseguia me lembrar da cena de 2001 em que o esperto macaco descobre que osso serve mesmo é para dar na cabeça da macacada do outro bando – Macacos me mordam! Por que insistem nessa música para casamentos?!

E então? (Tosse) A doutora já deve saber que, como no sexo, a cobrança por um bom desempenho... essa ansiedade aliada à imagem de um símio com um osso nas mãos (risos) faz com que nós, homens, não correspondamos às expectativas. É. Não cheguei lá. Brochei! Admito. E não só uma. Duas (pigarro): com minha bela prima e, em seguida, com o noivo, um precoce que já se molhava antes mesmo de nos tocarmos. E assim, em coisa de segundos, quando olhei ao meu redor, estava em meio a uma suruba daquelas, como um mero observador. Um voyeur assistindo ao gozo alheio. Um frígido, que se chegou a se umedecer, foi graças ao discurso do juiz (pausa para água)... com múltiplos e prazerosos bocejos.

Exposição revela integração Brasil-Japão nas artes

O Club Transatlântico, em parceria com o Consulado Geral do Japão em São Paulo, abrirá as portas para a cultura da Terra do Sol Nascente com a exposição em comemoração aos 100 anos da Imigração Japonesa. O objetivo é mostrar que a contribuição daquele país não se limita apenas à agricultura, ao contrário, atingiu todos os campos, inclusive a arte de maneira singular e expressiva.

A exposição contará com duas formas de expressão, a arquitetura, representada pelos templos, em quatro maquetes cedidas pelo consulado, e as artes plásticas pelas mãos de Wakabayashi, artista japonês influenciado pelos ares brasileiros.

Kazuo Wakabayashi imigrou em 1961 e, na bagagem, trazia uma carta de apresentação para Tomie Ohtake. Um ano depois, o pintor já realizava sua primeira exposição em território brasileiro, e dava início a uma trajetória de sucesso, que dura até hoje. Considerado pelo poeta e jornalista, Carlos Soulié, como o pintor japonês (radicado no Brasil) que mais traz em seus traços a cultura de seu país, Wakabayashi admite que, apesar de ter em seu estilo o lado obscuro do pós-guerra, período em que saiu do Japão, foi influenciado pelas diversidade de cores do país que escolheu para viver. O artista levou para sua arte uma nova forma de perceber o Brasil, expressando por meio de suas pinturas e gravuras uma forma peculiar de fazer arte. Para a exposição no Club Transatlântico, foram selecionadas cerca de 30 obras, algumas pertencentes a colecionadores.

Já no campo da arquitetura, quem visitar o Club durante a exposição irá conhecer construções japonesas fabulosas como o Portal Shureimon, eleito como um dos principais pontos turísticos da Província de Okinawa; o Santuário xintoísta Kasuga Taisha, um dos mais famosos e mais antigos do Japão e o Templo Yakushiji, famoso pelo seu belo pagode de três andares de 37,9 m. Todos são considerados Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco, e serão representados por maquetes. O Santuário Nikko Toshogu também estará bem representado em escala reduzida, o que, no entanto, não impedirá de impressionar o público com a vivacidade de sua ornamentação.

Acontece...
De 16 de junho a 10 de julho
De segunda a sexta das 9 às 22h
Entrada franca

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Freegans


Há alguns anos, num momento oportuno, em que eu cultivava barba e "idéias revolucionárias", conheci os vegans, esses que, além de não consumirem nenhum produto de origem animal, desprezam tudo o que seja testado nos bichos. Os vegans, que, embora, o nome se pareça com aqueles dados a criaturas más dos jogos de RPG, pregavam uma ideologia regada de paz, amor e muita alface.

Sempre apoiados em histórias com animais no papel principal, um deles me contou a de um cavalo, um andaluz, que chorou ao ouvir seu vizinho de baia emitir rinchado estranho enquanto virava bife. Depois de ouvir a comovente história, decidi que a partir de então eu não comeria nem carne de pangaré, entendi que seria um vegan (ou um "natureba", como seria chamado por aí)... até chegar o dia do churrasco na casa do tio Ermínio.

Após anos de muito cupim, coxa, fraldinha, picanha, costela..., soube por uns e outros que aqueles vegans tinham ganhado novo nome: freegans, e que, agora, além da ideologia, procuravam por meios alternativos de sobrevivência, na tentativa de burlar o sistema capitalista, até que se vissem livres dele. Frees, saca?

Quando a fome apertava, eles surgiam nos finais das feiras de rua atrás de tomates (pouco amassados), bananas fora do cacho...; nos lixos, reviravam aqui e ali, e lá estava uma peça de roupa ou algum utensílio doméstico. Dizem que uma deles até moto chegou a trocar pelo ecológico skate; já um outro, desfez o nó na gravata italiana e foi vender livros e camisetas na Alameda das Flores, em São Paulo. Sim, os freegans, (embora irritados com este rótulo que deram a eles) iam muito bem, estavam felizes e de consciência limpa, virando-se como podiam, à margem da economia.

Mas, em toda comunidade, por mais libertária que seja, figuram os fanáticos. Esses coitados, que de tanto se apegarem a discursos subjetivos, acabam por se "enforcar na mesma corda da liberdade" que pregam. Acontece que, lá pelas bandas do ABC, onde alguns freegans dividem um casarão desabitado, soube que chegou um rapaz novo para ajudar com a feira. Aproveitando-se das linhas tortas da cartilha freegan, o esperto rapaz burlou esse "sistema" para fugir da responsabilidade. Disse que abandonou a namorada (ainda de barriga) depois de saber que na carne dela havia produto industrializado. "Silicone, tsc, vê se pode!"